Sobre poemas e poetas
Autora: Anna Helena Altenfelder
Mestre em Educação, autora do fascículo Poetas da Escola do Kit Itaú de Textos
Mestre em Educação, autora do fascículo Poetas da Escola do Kit Itaú de Textos
Poemas e poetas: estes assuntos trazem muitos questionamentos a todos que se envolvem com o ensino de língua. O que é poesia? O que são poemas? O que são versos? Como ensinar a escrever poemas? Nosso objetivo, com este texto, não é esclarecer definitivamente essas questões, mas criar um espaço para a reflexão sobre elas antes de propor um caminho para o importante e necessário trabalho com poesia em sala de aula.
Olhar os poetas e suas produções com um olhar mais analítico, para além da fruição da beleza da poesia, requer bastante reflexão. Como o tema é polêmico e complexo e vem sendo freqüentemente abordado por grandes estudiosos desde a Antiguidade, há vasta produção de respostas. Essas respostas, porém, podem ser muito complicadas para servirem de apoio imediato à construção de um caminho pedagógico para o ensino de poesia e poemas na escola.
Para nos auxiliar no desenho desse caminho, podemos começar dizendo que, atualmente, admite-se uma grande divisão em dois gêneros para toda produção escrita da humanidade, desde os primórdios até hoje: a poesia e a prosa. Esses dois grandes gêneros se subdividem em inúmeros outros. No caso da prosa, podemos citar gêneros literários, como romances, contos e crônicas; gêneros originados do trabalho científico, como os artigos e relatórios; gêneros jornalísticos, como notícias e reportagens, entre infinitos outros gêneros. No caso da poesia, também há uma subdivisão em grandes gêneros, como o gênero épico ou o gênero lírico, entre outros. Todos os gêneros da poesia se expressam em poemas.
Poesia e poemas
Mas qual é a diferença entre as expressões poesia e poema? Será que elas querem dizer a mesma coisa? Segundo o Mini Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, poesia é a "Arte de criar imagens, de sugerir emoções por meio de uma linguagem em que se combinam sons, ritmos e significados". No mesmo dicionário, poema é definido como: "Obra, em verso ou não, em que há poesia", ou seja: quando falamos em poema, estamos nos referindo a textos que têm ritmo e sonoridade próprios e contêm poesia; quando falamos de poesia, nos referimos àquilo que torna um texto poético. O que torna um texto poético é o sentido artístico que seu autor consegue imprimir ao que escreve.
Os poemas só ganham existência concreta como elementos de comunicação se houver leitores interessados em ler o que os poetas escrevem. Essa forma de interação entre poeta e leitor indica elementos essenciais da situação em que os poemas são escritos:
- de um lado, estão os poetas, artistas que escrevem com a intenção de emocionar, divertir, convencer e fazer pensar o mundo de um jeito novo, original e único, de modo a encantar ou mesmo chocar os leitores, para aproximá-los do que sentem sobre o mundo, por meio da arte de escrever poesia em poemas;
- do outro lado, estão os leitores, pessoas que desejam, quando lêem poemas, sentir e emocionar-se com o que lêem mais do que raciocinar logicamente sobre o assunto lido.
- do outro lado, estão os leitores, pessoas que desejam, quando lêem poemas, sentir e emocionar-se com o que lêem mais do que raciocinar logicamente sobre o assunto lido.
É essa situação de comunicação especial própria da arte que dá o "tom" de poesia aos poemas.
Poemas
Para aprofundar a reflexão sobre o assunto e ter apoio suficiente para construir um trabalho eficaz em sala de aula, também é preciso, além de compreender que há diferenças entre poesia e poema, identificar características próprias dos poemas para auxiliar os alunos a compreendê-los. Não é fácil, porém, identificar essas características porque, em primeiro lugar, há muitos gêneros de poemas, cada um com suas particularidades, e , em segundo lugar, porque a poesia é o território da escrita onde há mais liberdade para escrever.
Assim, se tentarmos identificar poemas entre outros textos buscando formas típicas gerais, exemplares, que sirvam para classificar todos os tipos de poemas, não vamos conseguir grande coisa. Sonetos ou odes, por exemplo, tipos de poemas que existem desde épocas mais antigas, têm quantidade de versos e distribuição desses versos determinadas por regras rígidas, o que leva esses textos a terem formas gráficas bem definidas. Já os poemas contemporâneos costumam ter formas mais soltas, menos determinadas. Além de serem expressos em diferentes organizações e formas gráficas, os poemas também falam sobre diferentes temas: a terra natal, uma história ou, ainda, injustiças e desigualdades sociais. Assim, também não são temas próprios que definem os poemas e os distinguem dos textos em prosa. A existência de rimas, por outro lado, também não é suficiente para transformar um texto em poema.
Como distinguir, então, um poema de outros textos? Uma indicação segura é a sonoridade, o "tom" que eles apresentam. Os poetas, ao escreverem, buscam que o poema tenha uma cadência, como um tambor batendo em intervalos regulares, o que faz com que o leitor perceba o texto poético pelo ouvido. É por isso que tão gostoso quanto ler poemas é ouvi-los sendo declamados. Além de apoiar-se no ritmo, para dar ao que escreve o "tom" de poema, o poeta usa outros recursos: joga com a sonoridade das palavras, busca sons similares rimando as palavras no final dos versos, ou repete sons parecidos ou iguais em várias palavras, fazendo com que elas ecoem ao longo do texto. Muitas vezes o poeta pode ir além e transmitir a impressão que algo lhe causou, criando imagens. Pode usar, também, o recurso da metáfora, dando às palavras um sentido mais rico, como se elas quisessem dizer mais de uma coisa ao mesmo tempo, ou fazer comparações.
Além de ser percebido pelo ouvido, um poema pode ser identificado pelo olhar, pelo modo como o texto é disposto na folha de papel. Alguns poetas dispõem os versos nas páginas de forma tão especial que criam uma imagem concreta, dando ao leitor a idéia do que vai ler, antes mesmo de ler as palavras. Se o poeta escreve sobre girassóis, por exemplo, pode dispor as palavras no texto em forma de girassol, reforçando a imagem que as palavras trazem. Todos esses recursos utilizados na escrita de poemas despertam a compreensão do leitor mais pelos sentimentos e emoções, do que pelo pensamento racional.
Assim, diferentemente do que se pensa usualmente, poema não é só aquilo que rima, tem sílabas contadas, musicalidade ou um esquema definido de composição. Não é só a forma e o ritmo que o definem, mas, principalmente, a maneira como o poeta vê as coisas, como nos revela Fernando Pessoa, na voz de Alberto Caeiro, seu heterônimo:
"Não me importo com as rimas.
Raras vezes
Há duas árvores iguais, uma ao lado da outra.
Penso e escrevo como as flores têm cor."
Raras vezes
Há duas árvores iguais, uma ao lado da outra.
Penso e escrevo como as flores têm cor."
Para comporem seus poemas, os poetas, mesmo aqueles já consagrados, passam muito tempo arrumando o que escreveram, organizando, mexendo com as palavras, experimentando vários jeitos de fugir do lugar-comum, romper clichês e encantar o leitor com sua maneira própria de ver o mundo. Como se vê, não é só de inspiração que são feitos os poemas: ao contrário do que parece à primeira vista, o ofício de poeta exige muito trabalho.
A escrita de poemas pelos alunos também exige trabalho: leitura de muitos poemas, reflexão sobre a situação de produção, atividades para que se apropriem de recursos poéticos e possam utilizá-los com facilidade. Alguma inspiração também é necessária para que os poemas aconteçam, é claro. Mas convém dizer que inspiração só se realiza concretamente quando dominamos os instrumentos necessários para lhe dar vida e que ela se torna mais refinada quando praticamos continuamente o uso desses instrumentos. Assim como um pianista precisa ouvir muita música e saber utilizar seu instrumento, o piano, para compor e tocar
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